quarta-feira, 11 de maio de 2016

Dilúvio.

Uma mulher sentada nos bancos de espera, chora. Com uma das mãos segura o queixo e chora. Chora copiosamente. Não parece um pranto chateado e, pela cadência, percebe-se que nem sequer se trata de um ataque de ira. Apenas chora. Aproxima-se um homem de passo tranquilo, sem a olhar, sem dizer uma palavra, senta-se ao seu lado e começa a chorar também. Choram em uníssono, no mesmo tom, com os mesmos gestos, como se o tivessem ensaiado a vida toda. Aproxima-se uma fila de seres anónimos, da mesma estirpe, perfeitamente alinhados. Vão entrando a conta gotas. Não se vislumbra o final. Chegam, sentam-se em silêncio e começam a chorar. Os olhos avermelhados e o olhar perdido no horizonte. Não há dissonâncias. Apenas choram. Como se o fizessem a cada dia das suas vidas. Como se o destino lhes tivesse reservado esse papel. A todos e a cada um deles.

8 comentários:

  1. quantas formas de desemprego dos dias existem?

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    1. Tudo tão ínfimo,tão falível, tão precário, tão incerto... tão normal. Que estranhos tempos, estes!

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  2. Perante esta crua realidade, o termo "desempregado" quase que funciona como um eufemismo. Na teoria, um desempregado é um candidato a um novo emprego. Mas como? Se não existem novos empregos para a maioria das pessoas? Na verdade, um desempregado só é desempregado se existir trabalho para ele. Atualmente, estar desempregado é estar desempregado de muita coisa, é muito mais do que não ter emprego. É toda uma vida que é posta em causa. É um dilúvio de desespero.

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    1. Uma crueldade, Miss Smile. Por vezes, olhando nos olhos de quem o vive, fica a ideia de que ainda é possível viver uma existência de tranquilo desespero.

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